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A polêmica sobre o Conselho Municipal de Trânsito e Transporte em São Paulo

Fonte: Vá de Bike

 

O Conselho Municipal de Trânsito e Transporte (CMTT) pretende se estabelecer como um espaço participativo para a discussão e proposição a respeito do tema em São Paulo, mas sua forma de sua implementação e composição tem causado polêmica entre ciclistas e entidades que os defendem.

 

Estabelecido no âmbito da Secretaria Municipal de Transportes pelo decreto 54.058, assinado pelo prefeito Fernando Haddad em 1º de julho de 2013, visa “garantir a gestão democrática e a participação popular”, mas não faz nenhuma referência às entidades que representam os ciclistas na cidade.

 

Ciclistas não estão representados

Composto por 39 membros, o decreto estabelece três grupos de representantes: de órgãos municipais, dos operadores dos serviços de transportes e da sociedade civil. Entre os operadores dos serviços de transporte, há um sindicato de ônibus, um de lotações, dois representantes das empresas de ônibus, TRÊS associações/sindicatos de táxi, duas associações de transporte de carga, um sindicato de motociclistas, um de fretados e turismo, um de transporte escolar e um de transporte rodoviário. E nenhuma associação de ciclistas.

 

É bastante curioso haver três entidades representativas de taxistas e nenhuma dos ciclistas, considerando que há mais viagens em bicicleta do que de táxi na capital, desde pelo menos 2007 (Pesquisa O/D 2007, Metrô): 303 mil viagens diárias de bicicleta, contra apenas 90 mil em táxis (veja aqui). A pé, então, nem se fala: são mais de 12 milhões de viagens por dia. E isso tudo considerando-se apenas o modo principal de deslocamento, ou seja: se a pessoa usou a bicicleta por 2km para chegar numa estação de trem e de lá seguiu uma longa viagem por trilhos (algo que acontece MUITO na cidade), esse trajeto de bicicleta não entra na conta.

 

A única referência a bicicletas é na denominação do SindmotoSP que, além de motociclistas, tem entre sua denominação “Mensageiros, Ciclistas e Mototaxistas” – isso porque o sindicato tem entre seus membros os bikeboys, entregadores que utilizam a bicicleta como veículo. Embora constituam uma categoria importante no uso urbano da bicicleta, sua realidade profissional difere do ciclista cotidiano, além de representarem parcela ínfima dos associados do sindicato, que dificilmente encamparia uma defesa maior dos ciclistas, já que precisa representar os motociclistas também.

 

Voz sufocada

As associações de ciclistas terão que tentar a participação como “representantes da sociedade civil”, que serão “eleitos em votação direta pela população local”. O decreto não especifica como se dará essa eleição, que deverá ser normatizada em até 60 dias pelo próprio CMTT. Caberá à Secretaria Municipal de Transportes a organização e realização dessa eleição, conforme definida pelos representantes atuais do CMTT. Enquanto a eleição não é realizada, os representantes da sociedade civil no CMTT serão “aqueles indicados pelo Conselho da Cidade de São Paulo”, segundo o decreto.

 

Dificilmente os membros do Conselho da Cidade apontarão alguma entidade que represente os ciclistas. E, ainda que o façam, uma única voz entre 39 terá efetivamente alguma força?

 

“É inaceitável que este tema, essencial para o crescimento da cidade e desenvolvimento sustentável de uma população, desconsidere o importante papel da bicicleta”, alerta o blog de Renata Falzoni. “Vale lembrar ainda o comprometimento do Prefeito Fernando Haddad de constituir um espaço de participação de ciclistas, registrado em reunião com representantes de grupos e entidades pró-mobilidade por bicicletas no dia 22 de março”, reforça o texto do site.

 

Passados mais de três meses, esse espaço de participação dos ciclistas ainda não foi criado e nem ao menos sinalizado. E o CMTT, que será composto sobretudo por representantes dos setores de transporte motorizado particular e público, irá “acompanhar a elaboração e a implementação do Plano Municipal de Mobilidade Urbana”, conforme o texto do decreto. Ou seja, quem vai opinar sobre a mobilidade urbana é quem tem interesse (econômico, inclusive) em que a cidade continue sendo projetada para atender ao transporte motorizado, sem termos nenhuma garantia de que se preocuparão também com pedestres e ciclistas.

 

Reação das entidades

A Ciclocidade elaborou uma Nota Pública, coassinada por diversos coletivos e entidades (entre os quais o Vá de Bike), questionando a composição e implementação do CMTT, bem como o conceito atrasado de “transporte e trânsito”, em vez de mobilidade urbana.  Segundo a nota, “essa nomenclatura está associada a uma visão ultrapassada, que dividia a locomoção urbana entre veículos motorizados privados (carros e motos) e veículos motorizados públicos (ônibus), desconsiderando a mobilidade humana (pedestres, ciclistas e cadeirantes)”.

 

A nota alerta que, sem que definição prévia dos setores de cada representante da sociedade civil, a eleição “apresenta enorme risco de aparelhamento do órgão por setores econômicos consolidados”, e lembra o compromisso assumido pelo prefeito na reunião com os ciclistas em março, sobre a criação de um espaço de participação de ciclistas nas decisões da Prefeitura. Conclui afirmando que o formato proposto no decreto desconsidera esse compromisso e “exclui mais uma vez a mobilidade por bicicletas dos processos participativos e das decisões sobre a mobilidade urbana”.

 

 

Nota Pública: Conselho de Transportes

Exmo. Sr. Fernando Haddad, Prefeito de São Paulo,

Exmo. Sr. Jilmar Tatto, Secretário de Transportes de São Paulo,

 

Nós, entidades e grupos relacionados à mobilidade urbana, nos manifestamos a respeito da constituição de um Conselho de Transportes na cidade de São Paulo, estabelecido pelo decreto 54.058, de 1º de julho de 2013.

 

Saudamos a decisão de criação de um espaço participativo para a discussão e proposição a respeito do tema, mas consideramos problemática a forma de sua implementação, bem como a composição desse conselho.

 

Entendemos que a implementação de conselhos participativos deve ser precedida por ampla discussão pública, incluindo audiências que busquem colher subsídios da população a respeito das finalidades, do funcionamento e da composição desse órgão. A criação de um conselho sem a obediência de tais ritos destrói pela raiz as noções de participação democrática e transparência.

 

Consideramos que esse Conselho insiste em um conceito atrasado ao ser denominado de “transporte e trânsito”, já que essa nomenclatura está associada a uma visão ultrapassada, que dividia a locomoção urbana entre veículos motorizados privados (carros e motos) e veículos motorizados públicos (ônibus), desconsiderando a mobilidade humana (pedestres, ciclistas e cadeirantes).

 

Acreditamos ainda que a proposição de uma eleição de 13 representantes da sociedade civil, sem que estejam definidos previamente os setores de cada representação, apresenta enorme risco de aparelhamento do órgão por setores econômicos consolidados, violando o conceito fundamental da isonomia.

 

Por fim, lembramos que em reunião com representantes de grupos e entidades pró-mobilidade por bicicletas, em 22 de março deste ano, o prefeito Fernando Haddad se comprometeu em constituir um espaço de participação de ciclistas, favorecendo a transparência das ações e processos executados pela prefeitura.

 

A criação de um Conselho de Transporte e Trânsito com o formato proposto no decreto desconsidera tal compromisso e exclui mais uma vez a mobilidade por bicicletas dos processos participativos e das decisões sobre a mobilidade urbana.

 

Assinam:

 

Associação Transporte Ativo

Bicicletando

BikeForever

Ciclocidade – Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo

Coletivo CRU

Instituto Aromeiazero

Instituto CicloBR de Fomento à Mobilidade Sustentável

Instituto Harmonia

Instituto Mobilidade Verde

Las Magrelas

Loop Bikes

M&C Saatchi F&Q

OBRADO Redundante

oGangorra

Pedal Verde

PedalZN

Renata Falzoni Produções

Rios e Ruas

SampaPé

União de Ciclistas do Brasil

Vá de Bike

 

[FONTE]

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