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Relato sobre reunião com Secretário Estadual de Transportes

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Na última terça-feira (6/9), a Ciclocidade se reuniu com o Secretário Estadual de Logística e Transportes, Alberto José Macedo Filho. Tentávamos este encontro há exatos 2 meses, após a morte de mais um ciclista na rodovia dos Imigrantes.

Na ocasião em que pedimos a audiência, escrevemos que “o Governo do Estado é omisso, indiferente, por vezes até cruel, com quem opta por se deslocar de bicicleta”. Uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo da mesma época, sobre mortes nas estradas, também deixou clara a preferência do Estado em ressaltar a qualidade de pavimento das rodovias, em vez de indicar que a prioridade deva ser melhorar a segurança de quem trafega por elas – em especial a pé ou em bicicleta (leia a reportagem neste link, em especial a nota de resposta do DER e Artesp).

Como pautas, vários assuntos que se acumularam ao longo dos anos, como:

  • como incluir a obrigatoriedade da implantação de estrutura cicloviária nos contratos de concessão das rodovias, sendo que alguns desses contratos serão renovados nos próximos anos; há também municípios que estão implantando sua própria estrutura cicloviária nas estradas, uma vez que o Governo do Estado não o faz;
  • como destinar um percentual de arrecadação dos pedágios para a implantação de infraestrutura cicloviária;
  • a questão da Rota Márcia Prado, que desce de São Paulo a Santos pela Imigrantes, usando a estrada de manutenção da Dersa, e que está atualmente bloqueada pela Ecovias; outras rotas turísticas, como a Rota do Sal, também encontram-se sem sinalização ou apoio quando passam por estradas e rodovias estaduais;
  • a abordagem de ciclistas e apreensão de bicicletas na rodovia Mogi-Bertioga, com a justificativa de que tal apreensão se dá para a segurança dos próprios ciclistas;
  • o controle das velocidades nas estradas e rodovias estaduais, especialmente nos trechos urbanos;
  • a instalação de paraciclos, bicicletários e transportes de bicicletas nos terminais rodoviários, aeroportos, hidroviários e marítimos alinhados aos objetivos do programa “Transporte Sustentável”

 

Sobre os resultados, conseguimos:

  1. A criação imediata de um Grupo de Trabalho para que haja um diálogo constante com a Secretaria de Transportes do Estado de São Paulo. A composição deste GT ainda será definida, mas deverá ser composto por associações de ciclistas, técnicos do Departamento de Estradas de Rodagem – DER e da Agência Reguladora de Serviços Públicos Delegados de Transporte do Estado de São Paulo – Artesp, Polícia Rodoviária e mesmo por representantes de outras secretarias, como a de Turismo;
  2. Discutir a criação de uma rubrica específica para criação de infraestrutura cicloviária já para o orçamento para de 2017 (via GT);
  3. Convocação de uma Audiência Pública na Assembleia Legislativa já para a semana que vem para dialogar sobre novas políticas voltadas para a segurança e incentivo ao uso de modais ativos;
  4. Elaboração de um Projeto de Lei via Assembleia Legislativa que estipule um repasse na arrecadação vinda dos pedágios para a construção e manutenção de estrutura cicloviária nas rodovias do estado;

Estiveram conosco Renata Falzoni e Giuliana Pompeu, do Bike é Legal; Willian Cruz, do Vá de Bike; Murilo Casagrande, do Aro Meia Zero; Albert Pellegrini, d’oGangorra; Suzana Nogueira, coordenadora de Projetos Cicloviários da CET; Carlos Bezerra Jr, deputado estadual pelo PSDB; e Adriana Marmo, ciclista.

 

Discussão sobre segurança

Daniel Guth, diretor geral da Ciclocidade, iniciou a reunião trazendo o tema da morte de ciclistas nas rodovias estaduais. “A questão da segurança é central no porquê viemos aqui”, disse ele. “Apesar dos índices de morte terem caído, estão abaixo do que esperamos e do que pede a década de segurança da ONU. Temos nos mais frágeis uma condição de ausência de segurança – quem faz treinos sofre com motoristas alcoolizados e que permanecem impunes. O Estado tem a função de induzir o acalmamento de tráfego e podemos pensar em políticas mais efetivas.”

Guth citou a existência de pelo menos duas leis, uma de 1976 e uma de 1998, que obrigam a existência de infraestrutura cicloviária nas estradas. Isso faz com que o Governo do Estado esteja em desacordo com a lei há cerca de 30 anos. “Queremos começar a construir o caminho para que o Governo do Estado mude isso, pois sabemos que há alargamento de rodovias em andamento ou novas rodovias que nascerão sem essa infraestrutura”, ressaltou.

Os repórteres especializados Willian Cruz e Renata Falzoni também trouxeram as informações de que há acostamentos que vêm sendo retirados para a colocação de faixas adicionais e que, com isso, a polícia justifica a retirada de ciclistas trafegando pelas vias a própria falta de acostamento. Isso também acontece quando o acostamento é liberado para desafogar o tráfego em momentos de trânsito.

Para o diretor geral da Ciclocidade, Daniel Guth, “o Código de Trânsito Brasileiro é cristalino nesse aspecto: quando há acostamento, ciclistas devem circular nele; quando não há, podem circular nos bordos da pista. As apreensões de bicicleta que estão sendo feitas são ilegais. É o caso de Cubatão, onde a Justiça local, combinada com a Polícia local, não permitem que as pessoas pedalem por lá”.

Para o secretário estadual de transportes Alberto José Macedo Filho, “é importante rever, discutir e encontrar uma solução. Mas essas ações da polícia são ações de segurança para o próprio ciclista”. O secretário afirmou ainda: “Não podemos colocar recurso público para ter espaço ocioso. Não podemos fazer uma rodovia de quatro pistas para que uma delas fique ociosa. O Departamento de Estradas de Rodagem (DER) tem observado nas suas intervenções a viabilidade ou não de ter ciclovias nas estradas ou não, para que o espaço seja utilizado”.

Como simplificou Willian Cruz, para nós dizer isso é o mesmo que dizer que “não tem pedestre, em uma rua sem calçada”. Daniel Guth ressaltou o ponto: “Historicamente, o Brasil priorizou o transporte individual. Ou reforçamos essa ideia e sabemos onde ela vai dar, ou olhamos para o interesse público com outro entendimento, seguindo a legislação estadual e federal – em especial a Política Nacional de Mobilidade Urbana. A literatura já mostra que as pessoas migram o modo de transporte caso tenham opção e, se não fizermos essa leitura, vamos ficar no paradigma equivocado do século 20”.

Para o secretário estadual de transportes, no entanto, a Política Nacional de Mobilidade Urbana “cria um cenário ideal, o qual temos que adaptar, pois temos 21 mil quilômetros de estradas”. Quando questionado, Alberto José Macedo Filho afirmou ainda que “não há previsão de investimento” relacionado à implantação de ciclovias nas estradas.

Esta posição suscita vários questionamentos: se há há 21 mil quilômetros de estradas e há legislação desde os anos 1970 obrigando que estas tenham infraestrutura cicloviária, quando os estudos para a sua implantação ficarão prontos? Quantos ciclistas deverão morrer para que as estatísticas do DER indiquem que há de fato ciclistas nas vias e tomem uma atitude, em vez de tomá-la imediatamente e de modo preventivo, como pede a legislação?

Para o repórter Willian Cruz, “há medidas emergenciais que podem ser feitas a baixo custo e ter grande impacto, como é o caso da sinalização”. Daniel Guth mostrou ainda exemplos de intervenções municipais baratas nas estradas, como é o caso de Itanhaém.

 

Orçamento dedicado e criação de um GT

O deputado Carlos Bezerra Jr levantou a questão de que é preciso ter orçamento dedicado para que os esforços no sentido de implantar infraestrutura para bicicletas não seja em vão. Tal verba poderia sair de um percentual obrigatório no repasse dado pelos pedágios para Governo do Estado, o que poderia ser garantido por meio de um Projeto de Lei da Assembleia Legislativa.

“Quando olhamos para trás, vemos que avançamos pouco. Se a gente ousar no Legislativo, isso pode sinalizar para o país todo”, afirmou o deputado. Bezerra sugeriu ainda a criação de um Grupo de Trabalho formado por representantes da sociedade civil e da secretaria. “O investimento é pequeno e pode trazer um benefício incrível, seria um exemplo para o país”.

A sugestão foi aceita pelo secretário estadual de transportes. “Vamos montar esse grupo de trabalho”, disse ele. “Mas vocês também têm que ouvir o outro lado, para saber quais as dificuldades”.

Sobre a discussão do percentual de repasse dos pedágios ao Estado ter uma vinculação para infraestrutura cicloviária ficou definido que a discussão se dará em uma audiência pública convocada para a semana seguinte, na Assembleia Legislativa.

 

Cicloturismo e a Rota Márcia Prado

A questão do turismo por bicicletas e a falta de aproveitamento deste pelo Governo do Estado foi pontuada em diversos momentos da conversa.

Suzana Nogueira, coordenadora de Projetos Cicloviários da CET, ressaltou que países como a França, em vez de olharem puramente o caráter operacional, estão conectando todas as cidades com ciclovias. Isso poderia ser feito no estado de São Paulo por um plano estadual.

O mesmo ponto foi levantado pela repórter Renata Falzoni: “A secretaria de turismo sinalizou uma série de rotas e o Estado poderia estar se beneficiando muito do cicloturismo, ganhando dinheiro. Hoje temos uma sinalização precária e onde os motoristas não estão sendo induzidos a compartilhar com os ciclistas”. Falzoni citou também o exemplo da “Estrada dos Romeiros”, de onde os romeiros estão sendo proibidos de passar, mesmo sendo os responsáveis pelo nome da rota.

Murilo Casagrande, do Aro Meia Zero, trouxe a questão de haver bicicletários comunitários nos terminais marítimos, algo que poderia ser feito com pouco investimento e, ao mesmo tempo, gerar renda e pertencimento locais.

Daniel Guth, da Ciclocidade, levantou o problema da descida para Santos, hoje impedida pela concessionária Ecovias. “A rota Márcia Prado é oficializada e passa pela estrada de manutenção da Dersa, mas temos uma proibição em um trecho de 5km da Ecovias e não conseguimos dialogar, porque dizem que não está no contrato. Queremos a ajuda da secretaria para avançar”.

Sobre este ponto, o secretário estadual de transportes encaminhou a discussão para ser avaliada já pelo Grupo de Trabalho a ser criado. “Essas concessões, quando foram feitas, tiveram audiências públicas. O que não foi no contrato temos dificuldade de implantar”, disse ele. “O jeito é esperar vencer o contrato até 2018. Vamos ver essa pauta no Grupo de Trabalho”.

 

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Até a chegada à Secretaria Estadual de Logística e Transportes é difícil para ciclistas: há que se parar no poste.

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